quinta-feira, 17 de abril de 2008

"Carlos, Lucia, Chico e Tiago"

Dos posts anteriores e músicas do Milton Nascimento surge mais texto:

Esta noite tive um sonho.
Morava na minha antiga casa, no interior de São Paulo. Era noite e chovia.
Ouvi uns barulhos no corredor que passava pelo lado de fora da casa, ao lado das janelas dos quartos. Assustado, eu não tinha mais que 16 anos, fui até o quarto da minha mãe.
Ela estava muito calma e me disse "pode ser algo lá fora".
Fui até a janela e abri. Do lado de fora estavam dois muleques simplórios tentando entrar pela janela do quarto ao lado do que estávamos. Fiquei de fato assustado com essa cena. Um dos muleques, ao perceber que havia sido descoberto disparou uma vez em minha direção. Não acertou.
Fechei rapidamente a janela e corri para minha mãe, para pedir que ela me revelasse onde meu pai escondia sua arma. Ela estava muito calma e me disse que não era necessário isso tudo e, portanto, não iria dizer onde estava a tal arma.
Mas insisti firmemente, era preciso se defender desses muleques. Eles iriam entrar em casa e criariam muito terror entre nós. Eles estavam armados! Minha mãe continuava muito calma.
Ela enfim cedeu e me disse onde estava a arma. Estava escondida sobre o batente da porta, um local onde ninguém jamais olharia. Era uma chave de fenda muito comprida.
Apaguei as luzes da casa e esperei. Eles abriram a porta da cozinha e entraram. Eles revistavam cuidadosamente cada cômodo da casa. Eu fiquei atrás da porta do quarto, esperando que passassem.
Um deles entrou no banheiro, foi a deixa. Perfurei as costas do muleque com a chave de fenda. Havia muito sangue, e ele não conseguia se mexer, apenas tremia e seus olhos estavam arregalados, tentando descobrir o que acontecera.
O segundo vinha pelo corredor, cuidadoso e muito devagar. Sai do banheiro e já fui em direção a este. Ele também tinha uma chave de fenda, mais curta que a minha. Como se fossem espadas, retirei sua chave de fenda do caminha e perfurei o muleque no seu lado direito do peito. Sangrou muito também, mas ele não caiu. Perfurei o muleque mais duas vezes e ele caiu. Havia muito sangue. Eu estava sozinho na casa e chovia muito.
Resolvi ligar para a polícia mas minhas tentativas davam errado por muitos motivos.
Ainda no sonho, comecei a pensar e percebi a razão pela qual minha mãe estava tão calma:
Os muleques nada mais eram do que ladroezinhos, criados nesse mundo em que vivemos em que as pessoas preferem roubar a tentar acabar com o dineiro de uma vez e praticar um certo "sossego" na vida de todos. Eles eram as pessoas que não conseguem ver um lugar diferente, para eles o mundo já está dado, a verdade sempre foi verdade. Mas eles não sabiam muito bem o que faziam, eles apenas faziam.
As idéias de minha mãe eram contra a violência. Sendo eles o que eles eram, o que acabei de dizer acima, eles apenas entrariam em casa e levariam os bens materiais, depois iriam embora. Não havia problema em eles levarem tudo, pensava minha mãe. Eles também estavam assustados com tudo aquilo.
Mas eu queria fazer a justiça, queria proteger as minhas coisas, a minha família. Mas fiz nos mesmos moldes que os muleques usaram ao assaltar minha casa. Usei da violência, uma chave de fenda, eles tremiam mas não tinham como se mover, eles estavam assustados, eu estava assustado. A gente só queria acumular nossos bens materiais, pensando que isso iria preservar nossas famílias (ao meu ver, os muleques roubavam para ter como sustentar um possível família).
É isso. Sonhei esse monte de coisas. As vezes eu soho e fico inválido por dias. É bom se olhar no espelho de vez em quando.

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