quinta-feira, 17 de abril de 2008

"The Ecstasy of Gold"

Da sétima arte e de posts anteirores:

Ainda não tive coragem para assistir "Tropa de Elite". Já vi, por acidente, em um DVD pirata, o final, com o negão bateno no carinha na passeata pela paz, o garoto levando uma vassoura no rabo e o bandido levando tiro na cara, só de zueira.
Se você sentiu algum tipo de felicidade com essa descrição ao lembrar do filme, então pode parar de ler este post ou leia com muito cuidado.
Tenho tido muito medo. Nesses dias assisti a uma videoarte em que as cenas de violência do filme "Tropa" eram repetidas durante cinco minutos, com uma montagem da música "parapapá". Tenho tido muito medo com a aceitação da violência e com a forma como as pessoas se identicifam com o Bope do filme e principalmente com o personagem de Wagner Moura. Tenho tido muito medo da forma como a violência tem se mostrado em filmes. Afinal, os filmes são uma imagem da sociedade e, em uma sociedade em que quanto mais sangue, melhor, só nos resta comprar os coletes a prova de balas.
Claro que houve as guerras mundias, e elas foram um tremendo choque, mas estive pensando nas representações da violência por parte do cinema.
Os filmes de gânster da década de 30 eram violentos, mas não mostravam sangue para todo o lado, ainda que as balas rolassem soltas.
Alan Resnais em "Noite e Neblina" (1955) é eficientemente violento mas seu intuito é justamente criar o choque quanto a violência praticada nos campos de concentração da segunda guerra. Sua mensagem é bem clara, que aquilo não se repita. Assim como em "Hiroshia meu amor" (1959), a violência raticada contra a cidade e contra os personagens e contra toda a humanidade é mostrada para que aquilo não se repita.
Filmes como "Por um punhado de dólares" (1964) já começam a mostrar os pistoleiros e as terras sem lei. Clint Eastwood é o herói desses filmes de "Western Spaguetti" em que, para cada tíro cai um homem. Contudo não há sangue na tela e, nos filmes menos comercias, somente os vilões mais odiosos é que atiram em qualquer pessoa. A morte ainda é alegorizada. O herói é aquele que pensa antes de atirar e sabe onde está atirando.
"First Blood" (1982), também conhecido como Rambo I, ao contrário do que muitos pensam (e pensam por ter visto apenas os "Rambo" 2, 3 e 4) é um filme sobre a violência da guerra do Vietnã sobre aqueles que form combater sob os ideais enfiados em suas cabeças. John J. Rambo, ao contrário do que muitos pensam, mata apenas uma pessoa nesse filme, e ela é morta por acidente, ainda que seja um dos perseguidores do Rambo. John Rambo é preso ao final do filme, o herói é preso ao final do filme. Tamvez por essa razão o personagem foi subvertido nas segquencias de Rambo e somente a partir de então ele tenha ganhado o gosto do público. (meu, tenho muito a falar ainda, mas o espaço é curto).
Pulei 20 anos e cheguei em "Tropa de Elite" (2007). Wagner Moura e seus colegas de trabalho são os assassinos. Os assassinos convencionais são assassinos. As cenas de violência servem como um "Dois minutos de ódio" (George Orwell, livro "1984") . É uma sessão de cinema para todos poderem descarregar seus ódios sobre a tela, sobre a cidade, sobre o ônibus caro, sobre os pedreiros da obra ao lado, sobre o time do coração (que tb é uma especie de "Dois minutos"), sobre os peobres da rua pedindo grana, sobre TUDO. Em uma sequencia de sossego, adrenalina, sossego, adrenalina, que, para funcionar tem que mostrar um cara sendo queimado vivo, cheio de sons da pós produção para dar mais "corpo" à cena ou ainda gente apanhando na cara (plot keywords no www.imdb.com = slap in the face !!!), com muito sangue, sujeira, pós produção. Só assim o filme consegue tocar as pessoas. E as pessoas saem tocadas. Elas querem ser o Capitão Nascimento.
É disso que eu tenho muito medo.

2 comentários:

Unknown disse...

Acho que não dá pra usar a boçalidade das pessoas pra desclassificar um filme. O capitão Nascimento não deveria ser o herói de ninguém, quer dizer, não no sentido tradicional da palavra. Bom, eu não vou ficar explicando, mas basta dizer que eu gosto do personagem, não como espelho, mas como prospecto e como construção. Então assiste o filme, acho que tu vai entender.

Mas tá legal o comentário, só precisa de uma revisão.

Mura disse...

Não devo ter me expressado da forma como eu queria. A idéia é exatamente essa, "o capitão Nascimento não deveria ser o herói de ninguém". O que me incomoda é que, ao invés de usar o filme como uma reflexão da sociedade e da violência (e ainda a banalidade da violência nos meios de comunicação) as pessoas saem do filme apenas reafirmando aquilo que ele mostra. E é disso que tenho muito medo.