quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Gosto de sujeira boa

Roland Barthes, Walter Benjamin e (sim, maldito!) Adorno.
Me identifico com vocês quando falam da imagem, da sociedade da imagem, do fetiche.

Aprendi com a vida, com os mais velhos, com livros e filmes que a beleza é um momentum, algo passageiro, um tanto ilusório e incompleto. Digo isso porque sou um feio enrustido e recalcado e também porque me cansei da beleza higiênica-sonho-de-consumo.
O que me chamou a atenção e me fez grudar na tela quando assisti "Os Infiltrados" foi a injustiça com que são tratadas as pessoas que, por trás de uma máscara social imbecil, estão exatamente no mesmo patamar natural. O personagem do Matt Damon é o bonitinho do filme, ele é o garoto bom, com o cabelo penteado, vindo de família boa, estudou e se formou com honras, é um exemplo de sorriso no rosto e terno bem passado, subiu na vida como um campeão e pode conseguir todas as mulheres que desejar, afinal, ele é um lindo campeão. O personagem do DiCaprio, veio de uma família desestruturada, perde o controle facilmente por ser mais sincero aos seus sentimentos e seu senso de justiça, estudou pouco, não é tão arrumadinho e limpinho quanto o outro, não tem amigos, garotas, tampouco reconhecimento do seu trabalho.
O filme se desenrola mostrando, num plano bem inferior ao plano principal do filme, o quanto DiCarpio sofre por ser um ninguém na sociedade em que vive (a sociedade tanto da polícia quanto da máfia), e eu acrescento aqui que, em um paralelo com o personagem de Matt Damon, o personagem também sofre por não ser "bonito", bem arrumado e sorridente.

Pois bem, não é de hoje que é difícil descobrir quem realmente é bonito e quem se faz de fofo pra conseguir o que quer. Contudo, na nossa sociedade da imediatez, da imagem e da multipossibilidade, não há tempo pra se construir coisas sólidas e, dessa forma, com certeza a primeira impressão é a que vale. Me lembro que me disseram: "se você colocar uma corzinha aí, com certeza vai chamar mais a atenção", e o fim daquela "corzinha" não era significar absolutamente nada, era só chamar a atenção mesmo.
Não é possível mesmo entender completamente como as pessoas caem na mentira da imagem bonitinha, do garoto cabelinho arrumado, moda da vez ou contra-moda da vez (porque se a pessoa não é a moda da vez ou a contra-moda da vez ela não existe e fica desapercebida mesmo no meio social), da garota frágil precisando de ajuda, criança grande que jamais vai dar um passo sozinha em direção a uma morte mais honrosa. Como pode (mesmo, como pode?) um bolo de aniversário a uma pessoa que não merece? Só para manter o social, pra não ficar sendo o estraga prazer da vez? Mesmo que essa pessoa tenha lhe feito mal? "Acho que foi um mau entendido" - isso mesmo, vamos recalcar e esperar esquecer, baixar a poeira, aprendemos que o conflito é ruim e manda pro inferno quem fica bravo com outra pessoa.
Saio de casa pra conhecer o mundo, é só assim que vou conseguir alguma coisa de verdade. Quanto eu era moleque a gente ia dormir cedo porque não tinha mais nada pra fazer e acordávamos cedo pra ir pra escola, e de tarde tinha um monte de atividades, desde estudar até jogar bola. Hoje a molecada, quando não volta pra casa pra satisfazer seu desejo narcisista de internet, rede social, jogos online, faz isso direto dum celular em todo lugar. "O que é uma pedra?", entra no Google, escreve PEDRA e lê o que está escrito. Olha, são pelo menos dois mil anos de história da humanidade e, com certeza, você não estaria aqui lendo isso se seus antepassados fossem uns bundões que, quando querem saber o que é uma PEDRA, ficam estudando o simulacro de uma pedra ao invés duma pedra de verdade, cheia de terra e micróbio.

Quanto a mim, cronologicamente, percebi que não seria sendo o mais nerd e estudioso de colégio que eu me tornaria uma pessoa boa (estudar pra tirar nota e pra mostrar que consegue decorar mais é coisa pra robô). Depois vi que as roupas super legais e super caras e que mudam toda semana são uma bobagem que a rede Globo e a revista Caras coloca na cabeça das pessoas-zumbi, por isso resolvi usar roupas e acessórios no meu corpo que tivessem alguma mensagem PARA MIM, e que apenas as pessoas realmente desprendidas da convenções "Globais" conseguiriam entender. Depois fui vendo que uma barba escondia o meu rosto, escondia o que eu era de verdade, e por isso passei a me barbear sempre - hoje não acredito mais nisso, apesar de saber que a barba esconde o rosto e cria uma personalidade, ela é uma coisa natural do meu corpo e eu tenho que lidar com isso. Mais tarde vi que ser forte de academia também não presta pra nada, porque apesar de conseguir levantar pesos e pesos dentro das 4 paredes do lugar, fora a gente continua o mesmo bosta de sempre, além do que, carregando pedras por aí não somente a gente consegue a mesma força como ainda ganha uma corzinha de sol e uma mão realmente caleijada. Apesar de curtir muito o Rock e toda a ideologia que ele passa não sinto necessidade de andar por aí com cabelos rebeldes, camisetas das bandas, atitude rock-grunge. Essa ideologia está na minha cabeça, nos meus atos, não preciso de acessórios pra me dar mais energia, minha vida não é WOW, não vou ganhar +2 de Rock se usar uma camiseta xadrex, +4 de atitude se andar com um All Star surrado. Uso isso e ando com isso se eu quiser e me for confortável, caso contrário, foda-se, é só mercadoria. Tanto o é que eu andaria SIM por aí com camisetas que eu fizesse com letras do Doors, Black Sabbat, Beatles, etc. Olha, por um tempo cheva até a pensar assim: "se é preciso tirar uma foto pra provar tal coisa, então essa coisa é perda de tempo", quando via aqueles álbuns de foto do Orkut com um milhão de fotinhas iguais com churrascos, festas, roupas, etc etc etc.

Enfim, tem muita gente filadaputa por aí, casquinha bonita por fora e lazarento no coração, que está se dando bem na vida, ganhando coisas que não merecem, fazendo as coisas "sem pensar" e esperando que o resto da moçada esqueça o que foi feito. Pois bem, a moçada imbecil vai mesmo esquecer e continuar levando a vida desejando comprar seja o que for ou fazer a viagenzinha pra Paris pra tirar foto, mas saibam, vcs filhas da puta que sabem do que tô falando e se identificam com isso, que o pessoal mais velho nasceu num mundo diferente, com um pouco mais de honra inclusive na hora de fazer cagada.

Recomendo, além do filme "Os Infiltrados", duas leituras bem fáceis: o lirvo do "Hagakure" e "Perto do Coração Selvagem" da Clarice Lispector. Muito do que de pensa ser sujeira não é, pouco do que se pensa sobre si mesmo faz sentido.

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